ISSQN e a cobrança retroativa
Atualizado: 20 de dez. de 2023
Cuida-se de analisar a nova interpretação por parte da Fazenda Municipal de Porto Alegre sobre a arrecadação do ISSQN e sua incidência. O estudo por parte da Fazenda Municipal tem amparo no Decreto nº 15.416/06 em seu art. 49, onde são elencadas as atividades profissionais e o caráter empresarial ou a natureza comercial.
Para entender melhor o que está sendo discutido, temos que retroceder ao atual Código Civil em seu Livro II, DO DIREITO DE EMPRESA, que alterou substancialmente os conceitos e obrigações no âmbito empresarial. Pois bem, no art. 966 desse Diploma Legal, é considerado empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Já no parágrafo único, “não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa”.
Toda a polêmica criada pela Fazenda Pública tem seu alicerce na parte final do parágrafo único do aludido artigo, haja vista que a definição do “elemento empresa” cria algumas variáveis, sendo interpretado pela arrecadação sempre da maneira mais ampla possível.
Segundo Cristiano Carvalho e Rafael Bicca, o significado “elemento de empresa” é passível de três interpretações, sejam elas:
a) o foco está no papel efetivamente desempenhado pelos sócios da pessoa jurídica, que exige com que se verifique se estes passam a maior parte de seu tempo dedicada à gestão do negócio, à organização dos fatores de produção, ou se à realização das específicas atividades de sua profissão regulamentada;
b) tem como objeto as atividades que são desempenhadas pela pessoa jurídica, o campo de atuação da sociedade e se as pessoas que a integram se limitam ou não a realizar tão-só aquelas atividades que são exclusivas e específicas das profissões intelectuais científicas;
c) destina-se a verificar a forma com que esta sociedade se apresenta no mercado: como uma sociedade de profissionais liberais ou como uma sociedade com profissionais liberais, se perante o sentimento de seus clientes há um conjunto de individualidades ou se uma efetiva existência autônoma da sociedade como prestadora de serviços.
Voltando ao art. 49 do Decreto nº 15.416/06, o inciso III considera como sociedade de profissionais aquela que cumulativamente atenda os requisitos cujos profissionais, sócios empregados ou não, sejam habilitados ao exercício da mesma atividade profissional e que não possua caráter empresarial ou natureza comercial. Numa comparação entre os conceitos já expendidos, com o Código Civil, todos os profissionais, que tenham a mesma especialidade, mesmo que para o desempenho de suas funções, contratem assistentes e colaboradores, não são considerados empresários, pois seu foco é o atendimento individualizado, tendo como base da atividade o exercício da profissão de natureza intelectual.
Em nada altera a caracterização de não empresário, a sociedade ser regida por LTDA, muito embora alguns magistrados interpretem que se a sociedade é LTDA, existe a caracterização empresarial.
Esses magistrados têm a convicção de que apenas as sociedades de responsabilidade ILIMITADA é que tem o condão de descaracterizar o elemento empresa.
De outra feita, a arrecadação municipal, interpretando a legislação de forma a aumentar a arrecadação, pretende com isso enquadrar todas as empresas LTDA ao pagamento do ISSQN pelo faturamento bruto anual da LTDA, o que vem a caracterizar um aumento tributário. Como todas essas empresas vinham arrecadando o ISSQN por profissional e funcionário habilitado, e agora mudou-se a interpretação, o fisco municipal pretende cobrar as diferenças de forma retroativa a 5 anos, o que acarretaria um confisco sem precedentes, isso sem falar das multas e encargos que são inerentes.
Mesmo que a Fazenda Municipal tenha razão na sua nova interpretação, não poderia vir a cobrar de forma retroativa, impostos que por sua omissão e descontrole, deixou de arrecadar na época oportuna. Seria transferir seu erro para o contribuinte, que não deu azo ao fato. Se estava satisfeita com a arrecadação, nunca tendo se insurgido com o modo de cálculo do imposto, não há como agora retroceder 5 anos para de forma acintosa vir a arrecadar o que deixou de fazer na época oportuna.
A ocorrer essa cobrança de forma retroativa, estariam afrontando a Constituição em vigor em seu artigo 150, III, "a" e "b" e inciso IV e artigo 146 do CTN, já que tinham certeza jurídica da inexigibilidade tributária.
Portanto, qualquer cobrança retroativa que se pretenda, seria ilegal e inconstitucional, pois o não recolhimento se deu por força de ato administrativo e não por negligência dos contribuintes. Existe ainda o inciso II do art. 150 da Lei maior, vedando o tratamento desigual entre contribuintes, além de proibir qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida.
O parecer final é pela ilegalidade da cobrança, já que a autoridade fazendária não poderia aplicar a fatos geradores já consumados, critérios prejudiciais novos, não podendo ser cobrado imposto relativo a período no qual não era exigido/devido, pois também estaria a violar os princípios da Administração, como o da Moralidade. Recomenda-se alterar o tipo da sociedade para de responsabilidade ilimitada (sociedade simples), visando resguardar possíveis autuações.
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